quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Interesse público e política partidária? Mas que "raio" de coisas são essas?




A história que vos vou contar é verídica, e deveras interessante, porque nos permite reflectir sobre o estado da "arte de saber viver" actualmente em Portugal, e onde se constata que as vinganças e as perseguições pessoais estão muito acima do interesse público, e vão muito para além das lógicas político-partidárias...

Na última reunião do executivo camarário lamecense, e após troca de algumas impressões, “a latere”, a propósito do prémio APOM que o Museu de Lamego recebeu, mas que não foi devidamente valorizado em lado nenhum por quem de direito, o senhor Presidente da Câmara Municipal de Lamego não resistiu à sua própria vaidade e... descaiu-se, fugindo-lhe a boca para a verdade...! Foi então que me confidenciou uma parte do teor de uma reunião havida com o então Secretário de Estado da Cultura do anterior Governo, a propósito do projecto de requalificação do Museu de Lamego.

Fiquei a saber esta coisa espantosa:

I

O pretexto, diante dos factos:

O projecto de ampliação e requalificação do Museu de Lamego não teve o seu seguimento normal, como aconteceu com todos os outros projectos de todos os outros museus do Estado, porque contemplava, pasme-se o absurdo, o “exagero” da construção de um pequeno auditório para cerca de 120 pessoas. Desnecessário, segundo estes dois “especialistas” da matéria (Presidente da Câmara e Secretário de Estado, porque mais ninguém participou nessa reunião), uma vez que na cidade e nas proximidades do Museu de Lamego já havia auditórios, com particular  ênfase para o Teatro Ribeiro Conceição e o Museu Diocesano de Lamego.

Percebemos todos, portanto, que numa lógica de rentabilidade não comprovada de infra-estruturas citadinas, o Museu de Lamego (que possui actualmente um auditório próprio para seu uso quotidiano), teria de passar, após as obras de requalificação, a ter de se submeter permanentemente às agendas de entidades estranhas para utilização de um espaço fundamental e incontornável das suas próprias rotinas funcionais e programáticas. Esta percepção só pode provir de quem não percebe rigorosamente nada de museus, e muito menos de funções museológicas, mas enfim...
Ao menos que se tivessem aconselhado devidamente, recorrendo à opinião válida e credível de técnicos e especialistas do sector, nomeadamente os que acompanharam todo o processo constitutivo do projecto, o que não foi, manifestamente, o caso!

De cada vez que o Museu de Lamego tivesse de usar um auditório (para reuniões rotineiras de serviço; seminários, conferências e outras actividades similares no âmbito da sua própria programação anual; encontros pontuais e tantas vezes intempestivos; resposta pronta a solicitações de entidades terceiras; rentabilidade acrescida por eventuais alugueres de um espaço qualificado, etc., etc.) teria de depender de outras entidades que nada têm a ver com o museu, ou com o próprio Estado que o tutela, retirando a esta instituição museológica a imprescindível autonomia material e programática, no uso de um espaço fundamental para o exercício pleno da sua missão! Em suma, em vez de qualificarmos, desqualificávamos...

Engraçado e curioso... Todos os projectos de todos os outros museus contemplam a existência de um auditório, ou de sala polivalente similar a auditório, como não pode deixar de ser. O que é regra basilar para todos os outros museus foi aqui, para Lamego, considerada uma luxuosa e despropositada excepção.
Seria para rir, se não fosse dramática a ligeireza com que se descarta um investimento estruturante para a região de Lamego, a partir de um argumento sem qualquer sustentabilidade técnica e/ou funcional, e muito menos financeira, diga-se de passagem.

II

A verdade, por trás do pretexto:

É claro que percebemos perfeitamente a lógica subjacente a tamanho disparate e a tamanha incompetência avaliativa, protagonizada por ambos os personagens desta triste farsa que apenas prejudica Lamego, e nada mais:

1 - O Secretário de Estado da Cultura de então exerceu o seu poder contra Lamego porque um seu correligionário político teve a ousadia, juntamente com outros colegas de profissão, de manifestar a sua discordância técnica, legal e administrativa, ao modelo organizacional que propunha para os museus do Estado Português. Como hoje, aliás, continua a discordar pelas mesmas razões técnicas, legais e administrativas, que nada têm a ver nem com questões de política partidária, nem com direcções de entidades museológicas!
Portanto, nada como umas vingançazitas pessoais para pôr esta "gente na ordem", mesmo que se tratasse de um camarada de partido, ainda que o assunto fosse exclusivamente técnico e profissional... Valente socialista!

E como se prejudicar o interesse público (neste caso concreto o interesse público cultural da cidade de Lamego e de toda a região que serve), não lhe tivesse bastado, ainda conseguiu, por acção directa ou indirecta, afastar dos cargos directivos quem, por concurso público, exercia a sua actividade profissional com suficiente e reconhecida competência para o efeito... Valente republicano!

2 – Por outro lado, o Presidente da Câmara de Lamego encontrou neste processo um aliado inesperado na sua cruzada contra uma pessoa que tinha (e tem) o desassombro de lhe fazer frente, em termos políticos, em Lamego. E logo um aliado tão precioso como aquele, porque originário do mesmo partido do seu "ódio de estimação", interferindo directamente na área mais sensível do seu opositor político – a sua própria actividade profissional. É extremamente difícil encontrar melhor que isto para ajudar aos seus desígnios persecutórios. É claro que aproveitou logo a "deixa", por mais indecorosa que lhe pudesse parecer. Valente democrata!

E a defesa do bem público? Aquele tipo de defesa que um Presidente de Câmara de qualquer concelho faz sempre questão de possuir, colocando em primeiro lugar o colectivo que serve? É evidente que nada disso foi importante para o Presidente da Câmara de Lamego, porque assumiu maior relevância o facto de poder prejudicar um adversário político, com esta atitude de conluio e concordância, que defender o interesse de todos os lamecenses!
Isto pela simples razão de saber perfeitamente que uma grande parte dos lamecenses não está para se incomodar minimamente com assuntos que lhes diga colectivamente respeito, calando-se com duas tretas e encolhendo os ombros como se nada fosse com eles. Valente autarca!

E as lógicas do interesse público e das políticas partidárias sufragadas democraticamente, que suportam os poderes instituídos, onde se inserem aqui, neste estranho emaranhado de interesses duvidosos?

Eu respondo já – não se inserem em lado nenhum porque, simplesmente, não existem!

Agostinho Ribeiro

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

O dever ético da imparcialidade dos serviços públicos


A propósito do
Prémio APOM 2012, do Museu de Lamego.



(Nota prévia – Este meu artigo é escrito na qualidade de Vereador do Partido Socialista da Câmara Municipal de Lamego, e deve ser todo interpretado à luz do inalienável direito à livre expressão de opinião, nos termos constitucionais, sobre matérias relevantes que dizem respeito a Lamego e à sua dignidade e respeitabilidade colectivas, que integram, evidentemente, as entidades públicas aqui sediadas, como é o caso do Museu de Lamego).

I

As organizações e entidades estatais têm o estrito e indeclinável dever ético de serem imparciais, doa a quem doer, beneficiem quem beneficiarem, valorizem quem valorizarem, porque o interesse público deve prevalecer sobre os interesses pessoais.

Não podemos aceitar que os responsáveis pelas instituições estatais (leia-se de todos nós portugueses, contribuintes do serviço público e beneficiários do mesmo) fujam às suas responsabilidades inalienáveis de zelar pelo rigor, pela verdade, equidade e imparcialidade no tratamento e acompanhamento públicos dos serviços que lhes são dependentes.
Vêm estas breves considerações a propósito dos prémios APOM – Associação Portuguesa de Museologia, referentes ao ano de 2012, e as suas consequências publicitárias no que aos premiados diz respeito.

Como sabemos (ou se não sabemos, podemos saber, consultando o lugar internet desta Associação <http://www.apom.pt/pagina,57,111.aspx>, na categoria da Melhor Intervenção em Conservação e Restauro, ganharam o respectivo prémio, dois museus – o Museu Nacional de Machado de Castro e o Museu de Lamego, distinção que certamente honrará todos os lamecenses, como não pode deixar de ser.
Ainda nesta categoria, o projecto de Recuperação e Musealização do Mosteiro de Salzedas obteve uma distinta menção honrosa, o que reforça certamente o nosso orgulho colectivo por verificarmos que alguns trabalhos desenvolvidos na nossa região são reconhecidos como relevantes no plano nacional.

II

Mas há uma coisa que não se consegue perceber lá muito bem num serviço público, independentemente de tudo o mais, sendo que aqui o tudo mais só pode ter a ver com uma evidente falta de sentido ético e de noção das responsabilidades inerentes à prestação de um serviço público, que deve ser sempre sério e imparcial no que à ética e à moralidade públicas diz respeito.
Como certamente todos sabemos, o responsável pelo Projecto do Vale do Varosa é, actualmente, o diretor do Museu de Lamego, ainda que de forma provisória e temporária, nomeado arbitrariamente em regime de substituição, até abertura de competente concurso público.
Ora, sendo este o responsável momentâneo por estas duas entidades – Museu de Lamego e Mosteiro de Salzedas – os lamecenses têm o direito de saber porque razão se programou uma sessão de apresentação pública do projecto do Vale do Varosa, a pretexto da menção honrosa recebida da APOM, e não se organiza absolutamente nada (que se saiba até à data) no Museu de Lamego, uma vez que esta foi, precisamente, a entidade que recebeu o prémio principal a que tal categoria diz respeito...?

Mais grave do que tudo isto, é que tal atitude só pode ter sido avalizada por quem superintende em ambas as entidades, a Direcção Regional de Cultura do Norte, que assim nos demonstra um comportamento de ostensiva e criticável parcialidade, em prejuízo público da imagem de Lamego, que não abona nada a favor da seriedade e equidade desta entidade pública estatal, a exigir competente explicação e retratação públicas.
É claro que se percebe muito bem porque razão o não fizeram, e tentam esconder (tanto quanto possível) esta verdade incontornável de ter sido o Museu de Lamego, e não outra qualquer entidade pública cultural da região, a receber o importante e encorajador prémio - O projecto que mereceu tal reconhecimento nacional foi iniciado na direcção anterior, sendo diretor do Museu o signatário destas breves considerações, e não o que provisoriamente assume tais funções, em regime de substituição!

III

Posto isto, nunca é demais sublinhar que ninguém põe em causa o direito absolutamente legítimo do Mosteiro de Salzedas realizar uma sessão pública para divulgação e publicitação da menção honrosa que recebeu. Acho muito bem que o faça, e seguramente que todos nos regozijamos com essa realização.
Agora, sabendo todos nós que quem recebeu o Prémio, na verdadeira acepção da palavra e do conceito, foi o Museu de Lamego, e sabendo que o responsável de uma é, actualmente, também o responsável da outra entidade premiada, exigia-se pelo menos a igualdade de tratamento, senão mesmo a precedência publicitária do prémio mais elevado, por uma simples razão de justiça e imparcialidade.
Responsáveis por serviços públicos não devem, em nome do Estado que representam, agir à revelia da verdade e do direito ao tratamento justo e equilibrado, ainda por cima mais do que merecido.

Mas como, pelos vistos, alguns serviços do Estado em vez de serem e estarem ao serviço de todos nós (como devem ser e estar sempre e em qualquer circunstância), parecem ser apenas de alguns (a deduzir pelos actos produzidos) e ao serviço de interesses excessivamente personalizados, a mais das vezes a roçar situações de legalidade duvidosa, como já referi anteriormente num dos meus escritos (Vide “A Magia dos Amigos”, publicado neste blogue em 5-11-2012), nada nos “espanta” no exercício imoral de tais actos discricionários.

E afirmavam alguns (os que apostam forte na minha destruição profissional e política, mesmo que seja à custa do interesse público) que o Museu de Lamego sairia altamente beneficiado com este novo modelo organizacional. Vê-se bem neste caso, em que a entidade principal, que ganhou o prémio principal, se vê subalternizado por uma mera questão de inveja ou ciúme pessoais, porque outra qualquer razão se não vislumbra nem alcança... Um verdadeiro e fortalecido modelo organizacional, como o que tenho defendido publicamente, juntamente com outros colegas de profissão, jamais admitiria situações de tamanha injustiça e arbitrariedade.

IV

Há quem pense que com meia dúzia de tostões, umas pequenas intervenções aqui e ali, junto com alguma poeira mediática lançada para os olhos dos lamecenses, bastam para nos calar a todos. Mas não bastam, porque até mesmo o milhão de euros que o Estado despendeu no projecto de Salzedas jamais poderá servir de pretexto para inviabilizar o tão necessário projecto de ampliação e requalificação do Museu de Lamego, projecto esse que está concluído, instruído com todos os pareceres favoráveis que a lei exige, e pronto a ser executado...! Haja vontade política em avançar com o processo, por parte dos actuais responsáveis pelo sector cultural.

Portanto, não chega ficarem por meros remendos pontuais e casuísticos, e daí resultarem ostensivos auto elogios de grande actividade actual, como se nos últimos vinte anos o Museu não tivesse existido e, muito mais do que isso, não tivesse crescido em todos os índices mensuráveis, tanto qualitativa como quantitativamente, com particular relevância para o trabalho dos últimos dez anos, especialmente dedicados à elaboração de um projecto de requalificação museológica que não teme comparações com nenhum outro projecto similar já realizado no nosso País.

E que faz a maioria dos lamecenses, sabendo disto tudo (sendo que “isto tudo” é tão somente o Museu deles)?
Fazem o que têm feito ultimamente... Calam-se!
Num silêncio que a todos nos envergonha.

Agostinho Ribeiro