quinta-feira, 24 de maio de 2007

Museus de Território



Os museus de território podem ser considerados como construções teóricas relativamente recentes, no contexto da história da museologia, uma vez que as suas origens programáticas surgiram já em finais do séc. XIX, tendo como base de inspiração as exposições universais que se realizaram nesse século, sobretudo a partir da Exposição Universal de Paris, realizada em 1867.
Não tenho aqui espaço para discorrer sobre a relação que se pode estabelecer entre estas exposições universais e a construção do conceito de museu de território, e da ecomuseologia, termo que também se utiliza para identificar museus desta natureza, entre muitos outros que seria fastidioso aqui enumerar. Tive oportunidade de dedicar um capítulo inteiro da minha tese de Mestrado a esta problemática dos museus de território, já que o tema da minha dissertação foi, precisamente, “Um Museu para a Região do Douro: Fundamentos e proposta de Organização” (Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Abril de 2002).
Em todo o caso convém fixar a noção de que os verdadeiros inventores deste novo conceito tipológico de museu são os museólogos Georges Henri Rivière e Hugues de Varine, tendo aquele concebido o Musée des Arts et Traditions Populaires, e sido o fundador da Société d’Ethnologie Française, e este enquanto extraordinário investigador na área das ciências sociais, a partir da enorme experiência que acumulou em torno das problemáticas do desenvolvimento comunitário, que o ecomuseu de Creusot-Montceau lhe haveria de proporcionar.
Por todo o mundo podemos encontrar, hoje em dia, variadíssimas experiências museológicas no campo desta nova realidade de museus, que os franceses gostam de apelidar como “musées de société”, já que se procura actualmente sincretizar um sem número de designações díspares para identificar realidades idênticas ou muito próximas e similares. São museus que, independentemente da sua designação, estão especificamente vocacionados para a representação de uma dada população, num âmbito territorial específico, fazendo sobressair os traços fundamentais que caracterizam a natureza e a essência dessa mesma comunidade, diferenciando-a das demais, num processo evolutivo de permanente descoberta e construção, em simultâneo, da sua própria identidade cultural.
De tal forma esta nova realidade museológica adquiriu significado e expressão, à escala mundial, que existe mesmo uma sua estrutura representativa, afiliada no ICOM, e que se designa por MINOM – Movimento para a Nova Museologia, cujos objectivos programáticos se podem sintetizar no esforço reflexivo para a melhor interpretação destas novas realidades, e de contribuir para a divulgação desta recente tipologia de museus.
Estes novos museus têm, como atributos específicos, a sua capacidade especial de nos traduzirem novos olhares sobre os objectos, convidando-nos a repensar toda a museografia tradicional, para que possamos reinterpretar a história do território que serve e representa, na perspectiva do desenvolvimento sócio-económico das suas populações, aqui percebidas como agentes activos e dinâmicos na construção das suas próprias realidades materiais e imateriais. Aliás, é fundamental sublinhar que, na sua relação com a museologia tradicional, esta nova museologia reinventa alguns dos conceitos mais caros à museologia clássica, contrapondo com outros de natureza complementar – ao conceito clássico de colecção contrapõe-se o de património, ao edifício contrapõe-se o território e ao público contrapõe-se a comunidade.
Para além de Georges Henri Rivière e Hugues de Varine (França), os genuínos pais e fundadores deste tipo de museus, um sem número de personalidades, como Mário Vasquez (México), Jon Gjestrum (Noruega), Lourdes Horta (Brasil) ou V.H. Bedekar (Índia), Pierre Mayrand (Canadá), Per-Uno Agren (Suécia) ou Maurizio Maggi (Itália), António Nabais e Graça Filipe, Clara Camacho, Mário Moutinho e Cláudio Torres (Portugal), entre tantos outros, constituem nomes de referência na construção e formulação de conceitos em torno de diversas experiências museológicas deste género, à escala nacional e internacional.
 Estes contributos permitem-nos, assim, constatar que o conceito de museu de território não é propriedade intelectual singular, exclusiva de uma só personalidade, nem tão-pouco a característica típica de uma única realidade museológica.

Agostinho Ribeiro

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