quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

A nossa identidade cultural.



Sou dos que pensam que o desenvolvimento, enquanto processo de construção do bem-estar colectivo, deve andar sempre de mãos dadas com a cultura de um povo, de um grupo ou de um lugar.
O desenvolvimento não se deve processar contra a história ou contra o passado de uma qualquer comunidade. Antes pelo contrário, ele valida-se correctamente se souber integrar e respeitar devidamente as componentes identificativas que caracterizam esses grupos e espaços de vida, sendo adequado propugnar por melhorias e benfeitorias materiais nesses espaços, e não pela destruição, pura e simples, de tais monumentos da memória colectiva de uma dada comunidade.
Os exemplos que pululam por esse mundo fora, sobretudo nos países mais desenvolvidos, onde os espaços e valores da memória colectiva são cada vez mais protegidos, acarinhados e valorizados, demonstram bem que os verdadeiros intérpretes dos desejos de desenvolvimento sustentado são também os mais fiéis depositários e defensores das riquezas patrimoniais, artísticas e monumentais, materiais e imateriais, que identificam uma nação, um conjunto de nações (na perspectiva civilizacional) ou, tão simplesmente, um pequeno lugar, uma vila ou cidade, uma região…
Parece pacífico que as identidades culturais se afirmam mais na preservação da distinção e na valorização da diferença, e menos na criação de cópias redutoras ou na fobia insana de construção de semelhanças ou parecenças. Ou seja, destruir algo que é singular e único, verdadeiramente diferente de tudo o mais que conhecemos para, em seu lugar, construir um híbrido e descaracterizado espaço granítico, ou estacionamento para automóveis, igual a tantos outros, é acto criminoso de lesa património que deve ser repudiado e rejeitado por todos nós.
Não nos podemos esquecer que o que verdadeiramente nos distingue das outras cidades é a monumentalidade do tecido urbano da zona histórica, a tipicidade dos nossos bairros de características mais populares, os belos espaços ajardinados (infelizmente cada vez menos), a nossa história política, militar e religiosa, patente na globalidade do ambiente que se vive e respira em Lamego, diferente de todas as outras cidades. É essa a marca da nossa diferença, da nossa singularidade, da nossa própria identidade cultural…
Destruir valores patrimoniais que identificam a nossa cidade para, em sua substituição, se construir um qualquer benefício que poderia (e deveria) ter outras alternativas válidas, é um acto que não pode ser sancionado pelos lamecenses. Existem formas de resolução dos problemas de acessibilidade e estacionamento sem que se tenha de passar pela destruição do nosso património, porque optar pelas soluções mais fáceis de destruir para construir, apenas nos reforça a convicção da fragilidade, mediocridade e insensibilidade dos responsáveis por tais opções.
E depois, quanta legítima suspeição se não levanta a qualquer lamecense, pelo método seguido para se atingir tão insensatos objectivos, de se tentar fazer obra a qualquer preço, rapidamente e em força, sejam quais forem as nefastas consequências que daí possam advir… Não faz muito sentido e é estranho tal comportamento!
Nesta matéria, como em muitas outras que têm vindo a público em alguns órgãos de comunicação social, local e nacional, sou de opinião que todos deveríamos estar mais atentos ao que se passa em Lamego, já que em termos políticos, apenas podemos desejar, a quem opta por nos destruir e descaracterizar, que não sejam merecedores de uma segunda oportunidade!
Simplesmente porque a não merecem…

Agostinho Ribeiro

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